Advento: Semente de um tempo
novo
De novo o advento. Regressar ao
princípio. Refazer, como novidade absoluta, o caminho antigo. Assumir a
transumância como método. Ser nómada em obediência à voz antiga, aquela que
sobrevive entre uma multidão de ruídos, o apelo do deserto, «endireitai…», como
quem diz, «despertai!».
Começar de novo. Hoje é sempre a
primeira vez. Avançar. Assumir a tonalidade primeira, o acorde fundamental a
partir do qual se compõe um hino à mais pura das alegrias. E não ter medo da
alegria.
Ser tela onde a palavra já dita e redita
mil vezes – amor, perdão, paz… - se desenha como Boa Nova. Hoje, de novo,
porque amanhã não sei o que será.
Procurar os fios invisíveis que ligam a
terra ao céu. Reparar as ligações que me ligam a ti e a Ti. E recolher as
sementes da eternidade espalhadas, em noite de vendaval, por terras
desconhecidas. Encher a taça e voltar a semear. Pacientemente. Com esperança.
Basta a esperança.
Porque este tempo é um dom no qual se
desconstrói e reconstrói a memória. Porque neste tempo voltamos a ser como
crianças que andam à roda com as mesmas perguntas: «Onde fica Belém?», «quem
são os homens do Oriente?», «quando é que chega o Natal?». E espreitamos,
através da fé, o horizonte desconhecido à procura desse lugar, simples e
despojado, onde Deus se fez homem.
Porque neste tempo somos de novo o
adolescente sonhador que acredita no cumprimento da promessa repetida de
geração em geração, «Amanhã é Natal, Ele há de vir de novo».
Porque neste tempo não queremos ser como
casas pesadas de janelas fechadas e atulhadas de mobiliário comprado em tempo
de promoção.
Este é o tempo de escavar as camadas da
compreensão da verdade e aceder, ainda que de «maneira imperfeita», com uma
fé ainda muito imperfeita, às
razões do mistério
de Deus feito menino.
É o tempo de aceitar ser um rebento
enxertado no ramo de uma história milenar cujos frutos, sabe Deus, guardam as
sementes de um novo advento.
P.
Nélio Pita, CM